De início, é importante saber que, no Brasil, a participação nos lucros e resultados (PLR) é regulamentada pela Lei 10.101/2000 [1], além de estar prevista no artigo 7º, inciso XI, da Constituição [2], que enfatiza a natureza indenizatória desse tipo de bonificação e sua contribuição para a melhoria das condições dos trabalhadores. A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) [3], por sua vez, trata do tema nos artigos 63, 611-A e 621, permitindo que os instrumentos coletivos incluam cláusulas sobre PLR e assegurando a prevalência dessas normas coletivas sobre a legislação no que se refere a esta matéria.
Diante dessas informações, é possível que você se pergunte: mas, afinal, qual o real objetivo da participação nos lucros e resultados (PLR) quando adotada por uma empresa? Como o próprio nome já sugere, a concessão dessa verba tem como finalidade principal bonificar cada trabalhador de modo que ele saiba que seu empenho no ambiente de trabalho está sendo valorizado, em outras palavras, transformar resultados em ganhos financeiros.
Indo mais além, a PLR visa a estimular e reconhecer a contribuição dos empregados, tanto no cumprimento das metas quanto no progresso da organização, por meio da distribuição de valores calculados sobre um indicador que deve ser estabelecido em norma coletiva — pode ser o lucro líquido da empresa, a produtividade, o faturamento, ou mesmo a receita total da empresa. Essa prática busca promover uma cultura de engajamento, fortalecer o sentimento de pertencimento no ambiente organizacional e, não menos importante, melhorar a produtividade e os resultados das empresas, além de reduzir a rotatividade de funcionários.
Benefício facultativo
Deve-se frisar que a implementação de um plano de PLR por uma empresa não é imposta por nenhuma lei, tratando-se, portanto, de um benefício facultativo. Conforme consta no artigo 2º da Lei 10.101/2000, a adoção da PLR se torna obrigatória somente com a realização de negociação entre empresa e empregados, a ser formalizada por meio de convenção ou acordo coletivo.
Uma vez previsto em negociação coletiva o direito à PLR, o cálculo do valor do benefício deve considerar o número de meses efetivamente trabalhados, dentro do ano civil, por cada colaborador. Assim, caso um funcionário seja demitido antes da data prevista para o pagamento da parcela de PLR, terá direito ao recebimento proporcional ao tempo de serviço, melhor dizendo, ao período em que efetivamente contribuiu para os resultados positivos da empresa, conforme estabelece a Súmula 451 do Tribunal Superior do Trabalho.
Benefício a ex-empregados
Acontece que o trecho final da referida súmula, que afirma expressamente “…é devido o pagamento da parcela de forma proporcional aos meses trabalhados, pois o ex-empregado concorreu para os resultados positivos da empresa”, até pouco tempo, era comumente interpretado de maneira equivocada, fazendo com que muitos trabalhadores, ao serem dispensados sem justa causa, deixassem de ter o período de aviso prévio indenizado incluído no cálculo da Participação nos Lucros e Resultados.
Para grande parte dos Tribunais Regionais do Trabalho, bem como para diversos empregadores interessados em reduzir custos relacionados a verbas rescisórias e que se beneficiavam da ausência de uniformização da jurisprudência, durante o período de aviso prévio indenizado o trabalhador não estaria, de fato, prestando serviço e, portanto, “não contribuiria efetivamente para os resultados positivos da empresa“, como destaca a Súmula 451, sendo incabível a inclusão da projeção do aviso prévio indenizado no cálculo da PLR.
Desde 2010 [4], porém, o TST, demonstra claramente, em seus julgados, que este entendimento não merece prosperar, pois o período do aviso prévio indenizado integra o contrato de trabalho para todos os efeitos legais, conforme dispõe o § 1º do artigo 487 da CLT e a OJ nº 82 do SBDI-1 do TST. Esta última norma, inclusive, estabelece que a data de desligamento do funcionário corresponde exatamente ao término do prazo do aviso prévio, ainda que indenizado, não deixando margem para interpretações que excluam a projeção desse período de aviso prévio no cálculo proporcional da PLR.
Decisão do TST
Diante deste embate jurídico-hermenêutico e da ausência de entendimento consolidado entre os Tribunais do Trabalho — situação que gera insegurança jurídica e fere direitos básicos —, o Pleno do TST, sob a sistemática dos recursos repetitivos (IRR), decidiu em 30/06/2025, por unanimidade, que “a projeção do aviso prévio indenizado deve ser considerada para fins de pagamento proporcional da participação nos lucros e resultados” (RRAg nº 1001692-58.2023.5.02.0057). [5]
Com o julgamento do repetitivo, a Corte, além de reafirmar sua jurisprudência sobre o cálculo da PLR, também estabelece precedente obrigatório a todos os Tribunais do Trabalho (1ª e 2ª instância), contribuindo para a redução de litígios no âmbito empresarial e jurídico relacionados ao tema. A partir dessa decisão, os Tribunais Regionais do Trabalho e as varas trabalhistas estão obrigados a seguir essa orientação, e as empresas não podem mais excluir a projeção do aviso prévio do cálculo da PLR.
O que é feito diante da jurisprudência
Agora, diante dessa uniformização jurisprudencial, o que as empresas que adotam a PLR precisam fazer? E os trabalhadores como devem agir?
Os empregadores necessitam revisar suas práticas internas referentes ao cálculo e pagamento da parcela de PLR em casos de rescisão contratual sem justa causa. Devem, ainda, buscar adequar, urgentemente — em conjunto com a classe trabalhadora —, as cláusulas presentes em normas coletivas, incluindo expressamente o período de aviso prévio no cálculo da PLR, tal como monitorar o programa através do próprio RH ou através de um comitê interno de PLR, a fim de prevenir conflitos internos e evitar passivos trabalhistas, e provisionar valores corretamente nas rescisões contratuais sem justa causa para evitar futuras condenações judiciais.
Os trabalhadores beneficiados pela PLR, por outra lado, precisam ficar atentos ao montante a ser recebido quando ocorrer a rescisão contratual. É essencial que observem se, realmente, a projeção do aviso prévio indenizado (quando for o caso) foi incluída no cálculo elaborado pelo empregador, em conformidade com as normas vigentes e com repetitivo julgado recentemente. Caso seja constatada a exclusão indevida do período do aviso indenizado, o funcionário deve procurar, primeiramente, o RH da empresa e, se não houver a devida correção, buscar orientação jurídica para solucionar a questão.
Assim, levando em conta que o cenário de incerteza que pairava sobre a Justiça do Trabalho e sobre as empresas, no que concerne ao cálculo da parcela de PLR, foi absolutamente superado, empregados e empregadores precisam estar atentos aos seus direitos e seus deveres, assegurando que as relações de trabalho sigam o caminho da justiça social.
[1] LEI nº10.101/2000. Disponível aqui
[2] CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL DE 1988
[3] DECRETO-LEI Nº 5.452/1943
[4] CENTRAL DOS SINDICATOS BRASILEIROS. Cálculo da PLR deve incluir aviso prévio indenizado, decide Tribunal Superior do Trabalho. Disponível aqui
[5]TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. Aviso-prévio indenizado integra cálculo da Participação nos Lucros e Resultados. Disponível aqui
Clécia Cristina Galindo
é advogada do escritório LA Advocacia e mestre em Direitos Humanos pelo PPGDH-UFPE.