
Por: Vânia Rios
Na última semana, a Febrac participou do julgamento de tese jurídica no Tribunal Superior do Trabalho (TST) que discutiu a possibilidade de ajuizamento de dissídio coletivo de natureza econômica sem anuência expressa das partes, nos casos em que a Justiça do Trabalho entender haver “recusa arbitrária” da entidade patronal em negociar. A Federação foi representada pela consultora jurídica Lirian Cavalhero, que realizou sustentação oral defendendo a integridade do modelo constitucional de negociação coletiva.
Segundo a interpretação fixada pelo TST, a justiça trabalhista poderá suprir o comum acordo -requisito previsto no artigo 114, §2º, da Constituição Federal quando entender que a entidade patronal teria se ausentado reiteradamente das tratativas ou abandonado a negociação sem justificativa. A Febrac considera a tese indevida, por alterar a negociação constitucional das relações coletivas.
Durante a sustentação oral, Dra. Lirian Cavalhero apresentou argumentos técnicos que sustentam a impossibilidade dessa tese. Ela lembrou que o Supremo Tribunal Federal impede qualquer forma de flexibilização do comum acordo, seja presumido, tácito ou decorrente de comportamento.
“A Constituição não admite consentimento tácito. O Supremo já deixou isso absolutamente claro em diversas reclamações constitucionais. O comum acordo não pode ser flexibilizado, presumido ou suprido por conduta. Essa exigência é expressa e protege a autonomia coletiva”, afirmou.
Cavalhero destacou ainda dados do Dieese que mostram que oito em cada dez greves são resolvidas diretamente entre as partes, sem instauração de dissídio. “Precisamos incentivar a autocomposição das partes, porque são elas que entendem as especificidades de cada setor. É preciso privilegiar a autonomia das partes”, argumentou.
Ela também destacou a manifestação da Procuradoria-Geral da República contra o tema. “A própria PGR reconheceu que a tese viola precedentes do STF e que decisões que supram o comum acordo devem ser cassadas. A Constituição exige manifestação expressa das partes, e não há espaço para interpretações que substituam a vontade coletiva”, destacou.
Para o presidente da Febrac, Edmilson Pereira, a decisão traz preocupações imediatas para o setor. “A tese cria assimetrias perigosas nas mesas de negociação. Sempre atuamos com boa-fé, mas agora condutas legítimas podem ser interpretadas como ‘recusa arbitrária’. Isso ameaça a segurança jurídica e o próprio equilíbrio da negociação coletiva”, afirmou.
Edmilson Pereira também reforça a importância do comum acordo no sistema constitucional. “O comum acordo é uma trava que preserva a autonomia das partes. Sem ele, a negociação direta perde força e o Judiciário passa a substituir a vontade coletiva, exatamente o que o STF já proibiu reiteradas vezes.”
Diante da vigência imediata da tese, a consultora jurídica da Febrac orienta os sindicatos patronais a reforçarem a documentação de todas as etapas da negociação coletiva, até que o Supremo Tribunal Federal se manifeste sobre o tema. “Serão necessárias ações como comparecimento a todas as reuniões convocadas; justificativas formais de eventuais ausências; atas detalhadas; formalização de contrapropostas; respostas a ofícios e e-mails; pedidos de mediação ao MPT ou TRTs; e manutenção de dossiê completo das tratativas”, afirmou.
Processo: IRDR-1000907-30.2023.5.00.0000