José Daniel Gatti Vergna
Eduardo Bach Bitencourt
Catharina Madalena de Araújo
O Supremo Tribunal Federal finalizou, em outubro de 2025, o julgamento do Tema de Repercussão Geral nº 1.232 e decidiu que pessoas jurídicas do mesmo grupo econômico não poderão ser incluídas no polo passivo de uma demanda trabalhista somente na fase de execução.
A tese proposta pelo ministro Dias Toffoli, acolhida pela maioria dos ministros do STF, é a seguinte:
1. O cumprimento da sentença trabalhista não poderá ser promovido em face de empresa que não tiver participado da fase de conhecimento do processo, devendo o reclamante indicar na petição inicial as pessoas jurídicas corresponsáveis solidárias contra as quais pretende direcionar a execução de eventual título judicial, inclusive nas hipóteses de grupo econômico (artigo 2°, §§2° e 3°, da CLT), demonstrando concretamente, nesta hipótese, a presença dos requisitos legais.
2. Admite-se, excepcionalmente, o redirecionamento da execução trabalhista ao terceiro que não participou do processo de conhecimento nas hipóteses de sucessão empresarial (artigo 448-A da CLT) e abuso da personalidade jurídica (artigo 50 do CC), observado o procedimento previsto no artigo 855-A da CLT e nos artigos 133 a 137 do CPC.
3. Aplica-se tal procedimento mesmo aos redirecionamentos operados antes da reforma trabalhista de 2017, ressalvada a indiscutibilidade relativa aos casos já transitados em julgado, aos créditos já satisfeitos e às execuções findas ou definitivamente arquivadas.
Tal entendimento representa uma importante mudança de paradigma em relação ao que vinha sendo permitido pela Justiça do Trabalho.
Inclusão de terceiros no polo passivo
Não é raro se deparar com decisões trabalhistas que admitem a inclusão de terceiros no polo passivo da demanda sem a devida comprovação de comunhão de interesses ou propósito comum com a devedora direta, ou ainda, sem prévio incidente de desconsideração da personalidade jurídica, apenas com o objetivo exclusivo do pagamento do crédito trabalhista a qualquer custo.
Mais do que isso, os tribunais trabalhistas tendem a redirecionar a execução para outras empresas do grupo econômico e/ou aos sócios e administradores quando demonstrada somente a insuficiência econômica da empresa executada.
Com o novo entendimento formado pelo STF, somente será admitida a execução de terceiros em fase de execução nas hipóteses de sucessão empresarial e abuso de personalidade jurídica. Porém, ainda há uma certa subjetividade que precisará ser enfrentada pelo Judiciário diante desses cenários. Por exemplo, empresa que compra ativos ou ações de outra empresa torna-se necessariamente sucessora para fins de execução trabalhista quando a outra empresa que vendeu os ativos ou as ações continua existindo? E o que constitui o abuso da personalidade jurídica?
Desvio de finalidade e confusão patrimonial
É certo que já existem algumas decisões que definem o que seria esse abuso, como nos casos de desvio de finalidade (i.e., a pessoa jurídica é usada para lesar credores e praticar atos ilícitos), confusão patrimonial entre empresa e sócio, ou transferência de ativos ou passivos sem contraprestações etc. O contexto fático é mais amplo do que a realidade jurídica, de modo que o subjetivismo interpretativo deve ser esperado de algumas decisões.
Mesmo assim, a boa notícia é que haverá mais espaço na Justiça do Trabalho para defender sócios e administradores em redirecionamentos de execuções trabalhistas, especialmente daquelas em que tais terceiros são acionados pela Justiça do Trabalho sem qualquer prova concreta de nexo com o crédito trabalhista.
Com a prevalência desse entendimento, sócios e administradores de empresas terão a possibilidade de se defender em incidentes próprios, inclusive diretamente ao STF por meio de reclamação constitucional, e terão seus bens e ativos penhorados somente se houver a comprovação efetiva de que ocorreu algum abuso ou fraude na utilização da pessoa jurídica — a mera insuficiência econômica da empresa não será suficiente para o redirecionamento da execução aos bens dos sócios e administradores.
Além disso, haverá maior conforto também para investidores nacionais e estrangeiros, sejam elas pessoas físicas ou pessoas jurídicas, que tenham interesse em realizar operações societárias no Brasil, tendo em vista que a possibilidade de redirecionamento da execução trabalhista ficará mais restrita.
José Daniel Gatti Vergna
é sócio do escritório Mattos Filho.
Eduardo Bach Bitencourt
é advogado do escritório Mattos Filho.
Catharina Madalena de Araujo
é advogada do escritório Mattos Filho.